sábado, setembro 08, 2012

Tolentino Mendonça

[«deslocado» de JOC]

[J. T. M. é amigo de A. M. F. - padrinho de J., o amigo de (quase toda)uma Vida de D. - que não o  conhece pessoalmente;
da obra poética, algo tem lido - indo «agorinha» G. à Estante da S., encontra oito livros]

na página 36 - última - secção «Diário», do JL, n.º 1076, de 28 de Dezembro -
J. T. M. cruza registos autobiográficos com ensaísticos - «um Diário (diferente)» regista a 1.ª página do quinzenário
- algumas dessas Entradas - não datadas:

[...] ***
Nasci numa ilha, a Madeira. A maternidade onde nasci foi derrubada, nos anos 90, quando se fez a ampliação da pista do aeroporto. Mas sei que nasci ali. Porque recordo minha mãe, ocupada entre as flores. E meu pai, que me trazia de presente, das longas viagens marítimas, um pássaro. Porque me recordo de ter lido, numa falésia, não longe de minha casa, um livro de Herberto Helder.

[...] ***
Talvez todos os livros que lemos e se tornaram inseparáveis , todo o tempo fascinado que dedicámos a uma imagem, os motivos inexplicáveis que nos fazem escolher determinada música, talvez tudo isso seja apenas a preparação que nos é requerida para olhar um rosto. Transportamos frases, fragmentos, vestígios: não sabemos dizer bem porquê, até que de repente, isso que eram palavras ou imagens ou uma coisa tão ténue que nem se pode descrever, assoma como forma, mais sensível ou mais intensa, de escutar aquilo que habita um rosto.

[...] ***
Havia uma noite, na minha adolescência, em que se acendiam fogos pelas encostas. Lembro-me de um grito que descia pelas levadas, aos tropeções, e entrava, de noite, com os rapazes, pelo mar dentro. Esse grito continha, e isso poderá parecer tão estranho ao mundo moderno, o nome da terra.

[...]***
Cheguei à poesia pela tradição oral e julgo que essa impureza sempre me contaminará. Há muito tempo ouvi, de uma mulher pobre que lavava o chão da Igreja, na terra da minha infância, o primeiro poema. Que ela me disse e eu conservei como uma história, não como um poema. Foram precisos anos e anos para chegar, de novo a ele. Era uma página da Bíblia, do livro do Cântico dos Cânticos. António José Forte escreveu: há "gente que nunca escreveu uma linha que fez mais pela palavra que toda uma geração de escritores". Sei que isso é verdade.

[...]***
Antes dos vinte anos escrevi, sem especial premeditação, o primeiro poema. Chamei-lhe «A infância de Herberto Helder»
[...]
 

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