quarta-feira, maio 27, 2020

«ensinar a Missa ao Padre»

- 6 e 50: desligar da Máq. APN
- no exterior, a cinco, seis semanas do Fecho, Risol. - (aposent.a há cerca de 5 anos..) - entregou um telemóvel a F. e «zarpou»...;
- já lhe falara deste pai, brasileiro, que colocara o filho no Paraíso...; mas não estava formalizada a «intrusão» e o senhor, do «lado de lá», não entendia as informações que F. lhe prestava - (a quem se dirigir, como fazer...); com a conversa «descambada», antes de desligar - e de acordar - proferiu: 
«não quer que lhe vá ensinar a Missa ao Padre!»

terça-feira, maio 26, 2020

«à minha procura» («O mundo...) - Ruben A.

- nos anos em que o Género fez  parte do I Bloco, propunha aquele «ARRANQUE»...

RECORTES:
(…) Não sabia o que ia ver. Um cargueiro afundava-se e quarenta homens encomendavam a alma aos deuses revoltos do mar. Metemo-nos a caminho, daí a instantes acompanhávamos o rancho de mulheres da fábrica dos Marinhos, que, em grupo de quinze ou vinte, pareciam abutres à espera do boiar dos corpos. Frente à igreja do Lordelo a desgraça saía mais violenta dos sinos, ecoando ao vento, atirando badaladas num rebate onde as preces se tornavam impotentes. Sezé caminhava de chancas bem fincadas, eu sentia ali um tronco de carvalho do norte a que me podia agarrar se o naufrágio subisse palas margens acima, sentia que aquele homem, feito de uma só peça, estava a viver a tragédia. Era uma espécie de coro interior que o resolvera à caminhada. Primeiro assistira ao contar do espectáculo, agora queria participar dele, até nisso o carpinteiro se mostrava minhoto dos quatro costados. […] Ninguém se havia de salvar. Sezé, uma vez satisfeito da resolução, queria chegar a tempo, arrastava-me como quem puxa bácoro que vai à feira, dava a mão para me atrelar. […] «Vamos embora» ─ e eu saltava de poça em poça, metendo pé em água, molhando meia, e indo para o espectáculo daquele fim do mundo, que raro me amedrontava pela simples razão de nunca o ter visto.

  Pouco depois desembocámos no Ouro. Aí, junto ao rio, nem vivalma. O temporal expulsara as pessoas, e os barcos arrimados na margem pareciam os queixais tirados da boca do deus Neptuno. Estavam petrificados, a monte, e em dias de sol, durante a forte invernia, ainda serviam às crianças para  esconderijo  e aos velhos lobos-do-mar como abrigo para remendar as redes. O Douro não poupava as margens, subia, trazia manancial da Régua, das terras altas, uma barrela de água que do lado de lá parecia dar à Afurada um ar de esconderijo de pescadores lacustres. O céu fúnebre, de cinzentos a quererem luto pesado ─ o barro podre e turvo da cheia, o verde-escuro das árvores de folha perene, o som guinchado de carros eléctricos arrastando carreiros de água no seu vagar de precaução, e a ânsia de chegar para ver os que ainda lá estavam ─ , aumentava a passada de Sezé. Ele não falava, pensava com os mortos. Seria possível que não houvesse salvação? Estariam eles mesmo a morrer à flor dos olhos? [...]



Ruben A. O mundo à minha procura I – Autobiografia, pp. 22,23