quarta-feira, maio 29, 2019

Miguel Ângelo e o professsor de H. C. A.

- 10 para as 5 - desligar da Máq. «APN»
- W., como estudante de 12.º; mudara de área e assiste a uma aula de H. C. A.; sentado ao fundo, encostado à parede de Qd.o lotado, «chalaceia» com o da esquerda que, entre outras coisas lhe conta «que conhece o Mestre, que mora em Telheiras, e que lhe roubou todos os apontamentos»...; 
este, sentado, debita Matéria sobre Miguel Ângelo, que ninguém ouve, tal o número de «bitaites» cruzados...; a dado momento, levanta-se e, quando se aproxima, W. vê um jovem, louro, indiferente, por Classe, àquele «maralhal»...

sábado, maio 04, 2019

Faxismo nunca mais OU «onde estavas no 25?» . (Dulce M. Cardoso)

Recortes da Narrativa ABG de Dulce Maria Cardoso, da «Visão», de 25 de Abril:
[...] 
Mudáramos há menos de um ano, eu saltava à corda perto da igreja que se ia construindo com as contribuições dos fiéis, quando a Editinha magricelas apareceu afogueada com a notícia, Houve uma revolução na metrópole. Nem eu nem os meus amigos nos distraímos da brincadeira, a capital do Império era, para nós, tão irreal quanto o céu que, mesmo baixo de nuvens escuras, continuava lá longe. [...] Dali a menos de três meses, eu faria dez anos. Nesse meu aniversário, enchi-me de alegria infantil com os dois dígitos que desenhariam a minha idade para o resto da vida. [...] No dia em que a revolução fez um ano, corriam já, há muito, boatos de que os comunistas da metrópole queriam deixar os colonos morrer às mãos dos soldados independentistas, não interessava se homens, mulheres ou crianças, eram todos fascistas, colonialistas e imperialistas, ia haver maca da grossa. O martelar de caixotes tornou-se ensurdecedor, [...]      Quando fiz onze anos já não tinha casa nem infância. [...]

Ainda éramos retornados quando a revolução celebrou o seu décimo segundo aniversário. Eu era das poucas moradoras do desalentado Lote 11 que continuavam os estudos. Teria, nas palavras dos meus pais, uma enxada para a vida. Nesse ano, o 25 de Abril calhou num dia quente, Cascais encheu-se de veraneantes e eu passei a tarde encostada ao muro da praia dos Pescadores, a fingir que estudava as maçadoras lições de Direito. [...]   Dali a dois anos, os meus pais conseguiram mudar-se, por fim, do J. Pimenta, mas eu era já adulta. [...] e pouco depois vim para Lisboa. Por essa altura, alguém escreveu em letras enormes, no prédio que ainda hoje continua a desdentar o primeiro quarteirão da Avenida da República, junto ao Saldanha, 25 de abril sempre, faxismo nunca mais. [...]

                                                    
                        Crónica publicada na VISÃO n.º 1364 de 25 de abril