domingo, julho 13, 2025

«peutitá», la petite est lá»

[do artigo de hoje no «Público»]

[...] Dessa viagem que levou a família através de França, até Perpignon, onde se prepararam para cruzar a fronteira com Espanha, até à entrada em Portugal e, finalmente, a partida num navio que saiu de Lisboa, em direcção a Nova Iorque, diz ter apenas “duas memórias enevoadas”. Ambas recuperadas com intervenção do marido, também ele um sobrevivente do Holocausto.
    “Muitos anos depois da guerra, o meu marido levou-me ao local onde atravessámos a fronteira para Espanha e assaltou-me uma imagem da minha mãe a segurar-me, ela tinha um vestido azul e um chapéu de palha azul. Infelizmente, ela já tinha morrido, por isso não pude perguntar-lhe se estava mesmo assim vestida quando cruzámos a fronteira”.
O visto para a família de Mireille foi passado em Toulouse, por Emile Gissot, sob ordens de Aristides de Sousa Mendes


      A outra vem de uma palavra de conforto que se recorda de usar quando era ainda muito pequena e se sentia triste ou angustiada: “peutitá”. “Quando chegámos a Perpignon a minha irmã precisava de sapatos novos e eu, um bebé pequeno, afastei-me. Encontraram-me algum tempo mais tarde, com as pessoas a gritar: ela está aqui. Depois de falar ao meu marido naquela palavra de conforto que eu usava ele perguntou-me: ‘Sabes o que significa?’. Eu disse que não fazia ideia, mas que era algo que me fazia sentir melhor e que me lembro claramente de usar depois de chegarmos a Nova Iorque. Ele então disse-me que o som daquela palavra era o mesmo da frase, com sotaque provençal, ‘la petite est la’. A pequena está ali. De quando me encontraram.” [...]